terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Alma de todos os santos



Da mesma forma que ajoelho na igreja 
Batuco para erêibeji 
No desespero me apego em Buda 
Canto ao Deus pastoril pouco depois 

A oferenda da esquina era minha 
Fui eu que acendi a vela das metades  
Em vermelho e preto, em preto e branco 
E ao amanhecer agradeço com vela branca ao Espírito Santo 

A homilia do padre aos domingos escuto atenta 
No sábado o preto velho me disse que assim seria 
O pastor reafirmou o que ouvi agora a pouco 

Cantei a Oxum para mais um filho da terra nascer 
Hoxi o presenteou no ato com um escudo 
Sua mãe plantou espadas de Iansã pela casa 
Porque proteção Ogum prometeu 

O filho não sobreviveu, mandaram rezar a missa  
Acenderam a vela de sete dias 
Pediram as rezas de todo um povo que chora 
Obaluaiê o levou de volta 
Iansã o encaminhou para o encontro  
de Oxalá, OxaguiãDeus, Buda, Zambi, o senhor 

Nanã pediu paciência porque a dor já  ia passar 
E o povo acalmou tendo a certeza de que havia um lugar 
O capeta riu-se todo da dúvida 

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Escreveram meu sobrenome lá na pedra 
E mesmo sabendo que não era pra mim 
Danei a acreditar que era para ter graça 
Escrevi meu celular embaixo  
E deixei claro que atendo a cobrar...  

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Sr Edivaldo

Senhor Edivaldo era de poucas palavras, poucos atos, pouco tudo 
Me lembro dele pelos cantos 
Balançando em sua rede na laje da casa onde morava 
Ou então numa briga devido a um jogo de cartas 
Ou cuidando de seus passarinhos, galinhas, patos 
Ou assistindo o jogo do Vasco na sua televisãozinha  
Mas nunca me deveu sua companhia 

Passávamos as tardes ouvindo o canto dos passarinhos que tanto amava 
E conversando sobre a vida ou  sobre o que faltava para ela ser 
Há quem diga que só doutor sabe aconselhar 
Pois eu digo que um jardineiro me ensinou tudo  

Meu aniversário sempre foi sua alegria 
Para a neta, tudo o que ela nem merecia 
A mesa da cozinha estava sempre repleta de biscoitos 
Sempre me abraçava firme e orgulhoso 
E dizia: Parabéns!  
Eu disse que era de poucas palavras, poucos atos, pouco tudo 
Mas cada um sabe, quando há bem querer, o que a boca não fala, o que olhar não pode ver, o que o ouvido espera ouvir 

Senhor Edivaldo se foi 
E foi-se a primavera, outono, inverno e verão  
Foi-se muitos dos meus dias 
Como outro aniversário  
Em que não pude decifrar o que seu parabéns queria dizer 

Seu Edivaldo nasceu dia quatro de Abril  
Seu Edivaldo faleceu dia quatro de Abril 
E me pergunto se foi por infarto  
Ou porque quis 
Ele era de poucas palavras, poucos atos, pouco tudo 
Mas era um pouco muito certeiro 


Saudades...

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Fragmentos infantis

Ganhei uma cadeirinha de madeira do dono de uma loja de imóveis de Vila Isabel. Ele gostava muito de mim, enrolava seu dedo em meus cachos, como a maioria naquele tempo.
Fechava um olho e tentava manter o outro aberto, na expectativa de surpreender meus brinquedos, quando eles tomassem coragem de conversar e andar pelo quarto.
Meu pai sentou na minha cadeirinha de madeira em meio a cozinha. A cadeirinha que ganhei do tio da loja. E cadeirinha porque ela era bem pequena mesmo. Ele estava chorando e minha mãe falava muito do que não entendia. Ele havia perdido o emprego e era pai aos 28 anos de uma filha com cinco. Pertubador até para mim que não entendia disso ainda, mas que nunca tinha visto o pai chorar daquela maneira.
Sempre por perto de toda conversa adulta. Meu pai gostava, nunca me escondeu, nem amenizou.
Fui em um lugar cheio de gente vestindo branco e um deles jogou ervas em mim uma vez, minha avó disse que fazia bem e devia fazer mesmo porque era cheiroso. Nunca mais saí de lá.
Paramos em um estacionamento, minha mãe saiu do carro e meu pai ficou comigo, no outro dia me contaram que meu avô era uma estrelinha. E até hoje converso com ele depois de escolher a estrela mais linda.
Me emocionei em um Natal em que havia pedido uma moto. Ganhei a moto e uma boneca que se mexia e chorava. Eu disse ao meu pai que o olho dela estava escorregando.
Meu primo mais novo enfiava a unha no meu rosto todo domingo, que era quando a gente se encontrava, e eu chorava muito até o dia que minha avó disse para machucar ele também. Até hoje não consigo.
Em um aniversário com a família reunida, dediquei o primeiro pedaço de bolo ao meu irmão, que nunca conviveu comigo e fez muita falta. Tempos depois ele me disse que ele não era quem eu pensava. Outros tempos depois descobri que não era mesmo. Nem se ele se esforçasse muito conseguiria ser um herói.
Minha mãe sentiu vergonha de mim quando ela e meu pai foram me buscar na minha avó paterna e de tão feliz de vê-los, saí na rua descalça, com o cabelo pro alto e o pente preso.
Eu gostava de bolinha de gude, pipa, correr descalça pela rua. Vestia bermudas enormes, bonés para trás para andar de skate. Mas todo aniversário me davam Barbies. E pior, roupas.
Meu pai adorava me levar na pracinha do Alto da Boa Vista para andar de moto, até antes de ganhar a minha. Só ganhei a minha porque disse que minhas amigas não podiam andar comigo porque seus pais diziam que era muito caro e se eu tivesse, emprestava.
Era a preferida do meu avô paterno, que todo domingo deixava biscoitos na mesa da cozinha para mim. Ele escolhia a dedo cada um. Pena que quando ele não pôde mais estar aqui, já era tarde demais para conversar com estrelas.
Andava de mãos dadas pela creche com os meninos. A gente dizia que namorava e que íamos nos casar, mas não sabíamos que existia tanta papelada para se certificar de que há amor.
Passava férias na minha avó e voltava para casa cheia de bichinhos numa caixa de fósforo, que escondia no armário com medo da minha mãe ver.
Fazia trabalhos para as bonecas e os corrigia.
Meu pai viajou para Vitória e fiquei doente. Minha mãe me levou no médico e disseram que era saudade.
Meu pai viajava e eu deixava uma foto dele embaixo do travesseiro. Quando ele voltava, dormia embaixo da cama dos meus pais, do lado dele, no chão.
Briguei com minha mãe e a perguntei ironicamente se aquilo era ser mãe. O choro dela doía os meus ouvidos e me arrependi de tanta dor no peito que senti. Foi a única vez que meu pai me bateu e foi quando descobri que minha mãe estava a sete anos sem trabalhar para cuidar de mim.
Não me recordo de nada. Certamente, ainda não existia. Tudo que aqui escrevo me foi contado.
Tudo era do mesmo tamanho e, mesmo que não lembre, parecia ser melhor.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

O que fizeram de você, Fabi? O que você fez?

De novo me arrisco, arisco, nesse conto de anos atrás
Por onde você andou, menino, que ao te ver na minha frente, já não te encontro mais?
O que fizeram de você, Fabi
O que você fez?

É triste contar essa história mais uma vez...

De que me adiantaram tantos cafés da manhã
Se na manhã seguinte eu nem sabia se você estaria mais aqui
Seus olhos, baixos, me contaram o que você fez essa noite, Fabi

Mas, não importa.
Entre, feche a porta da cachanga, deita e dorme
Que zelo seu sono...


Fabi só era Fabi com uma bola nas mãos
Como todo menino, sonhava em ser profissional
Mas, profissão Fabi não tinha ainda não
Nem canudo, nem estima
A sorte ficou pro irmão


Hoje ele chora porque teve de criar a vida
Porque não chega o que procura
Porque sobreviveu na sua maldita 

Porque sobrou do que não tinha

O mal de Fabi é não saber sonhar direito
Acostumado com o sonho, dorme demais
Fabi pensa que malandragem é saber muito da vida
Quando, na verdade, a vida sabe o que faz


Fabi tem endereço, tem idade, tem passagem
E vive nos cantos desse país
Mas, esse Fabi é mais um porque quer
Porque quando lhe estenderam a mão
O orgulho não o deixou reagir


Fabi diz que nasceu e vai morrer sozinho
Eu não assisti nenhum dos dois
Rezo para que o destino não seja penoso
Mas, não mais todos os dias
Porque Fabi me virou as costas feito bruto
Não disse adeus
Como rezar por alguém que se vai e vive logo ali?


Fabi diz que igual Fabi só existe um
Deixa de ser tolo, Fabi
Existem de você por todos os cantos desse país
O primeiro presente de todo menino, 

depois de uma vestimenta azul, é sempre uma bola
E correr, é só ter perna, que se pode fazer.

Ai Fabi, a quem estou enganando?
Fabi tem é medo de tentar e fracassar.
Mas, só chega perto quem tentou.
Fabi está longe...
Fabi não é daqui...

Fabi tem medo de se entregar... Em tudo, em vão.





Pausa para o café:




Pois bem, esse Fabi realmente existiu em minha vida e merece esse lugar ao sol, nem que seja aqui nesse blog, com as minhas palavras. Hoje já não sei de Fabi. Não sei se acordou, se conseguiu dormir. Fabi era acima de tudo inconsequente, ilimitado, distraído, puro acaso. Me mostrou que não basta dizer que é simples, é preciso provar que se é e simplicidade, em nada, está relacionada ao dinheiro. Fabi não é único. Pode ser que tenha nascido realmente sozinho, mas vai morrer assim por opção. Ele realmente me virou as costas, digo isso no ato. Ele é assim, irreverente, inusitado. Sei que ao virar, pensou três vezes em quem deixava para trás, mas fez mesmo assim porque dessa forma, ele se sente melhor. Fabi escolhe a solidão porque de ruim basta ele. Palavras dele... 

Obrigada por virar as costas. 
Dedico esse texto com todo sentimento que tive, livre de rancor.



Me colocaram nesse mundo
Sem me passar as instruções
Se viro à direita, é por pura intuição.


Nada disso faz sentido.
Nada disso faz sentido, repito.

A tela da minha vida é preto e branco
Cheia de barros e histórias de antes de nascer
Ninguém me contou,
Ninguém quis saber.
O vale a pena ver de novo
Só faz sucesso na tv.

Nada disso fez sentido.

Uma falta não sei de que
Procurando por um não faz mal
A gente vive de aperto no peito
E acha normal
Se é o natural do homem
Que merda é viver!

Nada foi feito para fazer sentido.
Nada foi feito para fazer sentido, repito.

Paro o tempo, deitada nessa cama
Meu quarto é todo rosa, tipo menininha do gueto
A história se repete
Um dois três
Cinco dez vinte

Nada vai fazer sentido
Porque nunca fez.

Sentei no banco do ônibus
Estava escrito: Volte outra vez

Deus esqueceu o sentido
Vai ter que criar outro dia
Ou trabalhar no domingo

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Ai, mas que cansaço que dá 
das entrelinhas
E seus mistérios 
De tanto ler seus parênteses 
E compreender entre aspas...

domingo, 12 de outubro de 2014

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
Para cada mãe que chora é menos um no mundo.
Colocar a comida na mesa te rende um mês de trabalho mal pago.
As crianças crescem brincando de casinha e jogando bola,
sonhando em ter sua casa própria e ser o próximo Neymar da seleção.

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
Para cada mãe que chora é menos um no mundo.
É aonde a oportunidade não existe, ela tem que ser criada
Inventada, sempre que possível
Aonde aos filhos cabem os curativos quando assiste seu pai espancar sua mãe
Porque o prato de comida não está na mesa

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
Para cada mãe que chora é menos um no mundo.
É a terra prometida que não dá opção de escolha
Assumir-se não é uma hipótese
Gostar de homem, sendo homem, te torna viado
Gostar de mulher, sendo mulher, te torna sapata
Mas os filhos dos héteros estão nos rios afogados


Nascer negra te torna mais uma
Ter cabelo cacheado, a pele branca, te torna negra
E se você não estiver cor definida, você é parda:
Uma definição nova de viralata

Nessa brincadeira da “não possibilidade”,
pode ser a nossa mãe que chora.

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
E que o segredo das crianças está no esporte
Porque educação não tem
E que as pessoas estão nas filas de espera
Até do trem
Que perdemos amigos na boca de fumo todo o mês
E que a nossa polícia, a gente não sabe, se está ali para proteger
Ou para descarregar suas armas e nos jogarmos no Sumaré

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
E que lá em Madureira um povo canta e samba
Enquanto o tiro rola solto
E que eles chamam de comunidade o que é favela
E que o bolsa-família traz a esperança para esse povo
mesmo sendo esmola

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?
Depois das vinte e duas horas, é perigoso andar nas ruas
Mulheres são estupradas e obrigadas a dar a luz
É tudo democrático
Se você não votar, você paga
Se você tiver luz, água, gás, vida, você paga

Seus pais te contaram que isso aqui é Brasil?


Para cada mãe que chora é menos um no mundo.
E você tem que torcer para que não seja a ebola da vez.


*Porque esse texto tem nome, sobrenome e endereço.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Aviso: 
Mantenha distância.
Estou numa maré de ironia na qual nem eu mesma me suporto.
Caso você tenha algum problema com a verdade, mantenha distância para não se chocar com a mesma nas entrelinhas do que não foi dito e que, nem por isso, se deixou por dizer.
Obrigada.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

O acaso se faz tão cruel que parece que Deus se recusou a assinar embaixo.
Não tenho vocação para Penélope, mulher de Ulisses, que esperou vinte anos pelo marido. A vida é muito curta para esperar incansavelmente por alguém, até porque se quisesse realmente, aqui estaria. Não sei como as mulheres ainda conseguem sofrer por amor, como parte dos homens consegue não guarda-las. Meu amor termina assim que ouço o não. É claro que ser convidada a se retirar dói, mas cá entre nós, dói muito mais no orgulho... Aposto que se tivesse em minha cama, só mais uma vez, aquele que me disse não, eu viveria muito feliz e sem complexos. Mas nem sempre é assim.
A questão é que a vida é muito curta para esperar por alguém que pode nem chegar novamente ou para insistir que o que era pode voltar a ser algum dia. Eu não consigo esperar o chocolate esfriar nem seguro meu dedo a raspar o bolo antes de cantar parabéns sequer espero a tampa do dvd fechar... Logo, não espero por ninguém, nunca. Quem quer mesmo, aqui está e daqui não sai.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

"Estou num daqueles dias em que nunca tive futuro", disse Fernando Pessoa na carta a Mario de Sá Carneiro, em 1916. Fernando Pessoa, um grande da Literatura Portuguesa, nunca me fez ler algo com tanta compaixão. Sei bem do que fala. Sei desse sentimento de estrangeirismo, onde nada ao redor nos compõe, nada nos alimenta. Veja bem, nada nos alimenta. Nós, com essa alma que ânsia por tudo, morremos é de fome!
E já que não tenho noção nem interesse sequer desejo pela posse, o que seria depois de tudo se desapropriar de mim, de fato, meu? Não tenho nada, finjo ter tudo - porque sou poeta e, como Pessoa afirma, "O poeta é um fingidor", mas juro ao leitor que essa dor é sentida - e mesmo assim, falo do que não sei. É isso: eu não sei. É um vazio que dá, um jeito estúpido de ser um zé ninguém que me toma de mim. Nesses dias, nos dias em que nunca tive futuro, só penso no meu quarto, com a cortina fechada - aprecio imensamente o escuro de fora, que se mistura e se perde no que há dentro de mim - e minhas músicas tocando em modo aleatório porque desejo não me acostumar a absolutamente nada. Mesmo não havendo ao que ou a quem me acostumar... Só há um estranho aqui e esse estranho sou eu. Ironicamente, nem o espelho me reconhece, mas aqui, nesse escuro é mais seguro e bem melhor. Fora desse quarto, há muito, há o mundo, há você e sinceramente, estar junto é muito ruim. Quase ninguém me acrescenta e digo quase porque gosto de ser sutil. A maioria palavreia demais e empobrece a conversa. Minha cerveja eu divido com quem gosto porque ela é feito a água benta dos que andam sós até quando estão juntos. Prefiro ficar a cá, nesse escuro que já me domina. Aqui converso comigo e vou me entendendo... E, por favor, não me venha dizer que devo ir ao psicólogo, nem me atribua depressões sem tese.
Solidão contemporânea: disso que sofro. Parece absurdo. Na carta de Fernando Pessoa que usei anteriormente ele diz: "mas neste momento sinto que as frases absurdas dão uma grande vontade de chorar". Pois bem, feche a p
orta do meu quarto, a tranque e me deixe só com minhas lágrimas de hoje, pois do amanhã já não sei mais. Nunca soube.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Ah, me deixa.

Me deixa porque eu andei muito sobre aquelas notas musicais da 28 de Setembro. Me deixa porque já conversei muitas noites com Noel Rosa. E aquela adega ali era meu ponto de encontro na noite, todo mundo sabe.

Me deixa porque agora ando pelas cachoeiras, rios, matas, pedreiras. Me deixa porque dizem que evolui. Meu ponto de encontro é lá na Lapa, bem nos arcos, pertinho de seu Zé.


Me deixa porque eu que pago minha cerveja. Eu que sei do meu cabelo, da cor do meu batom. Eu não quero sossego mesmo não.

Me deixa porque verão já chegou. Carnaval está aí. E já que não rolou Bahia, vou de Rio de Janeiro a Janeiro.

Me deixa porque hoje eu tô do samba, amanhã do charme, depois do funk, da música popular brasileira. 


Me deixa porque sou carioca, sou espanhola. Sou parda e me chamam de nega.

Me deixa porque é fevereiro e eu já passei o ano inteiro me deixando para depois. Me deixa porque já escuto o som do tambor, a cuica berrando, os meus pés tão sambando sem nem eu dizer que chegou a hora.

Ah, dizem que samba tem hora... Samba tem hora não. A hora do samba é todo dia.

Me deixa porque tô com sorriso no rosto, já arrumei meu cabelo, botei aquela roupa e hoje passei o vermelho que é para não perder o costume. Hoje só chego amanhã, se o amanhã para mim chegar. Mas, se não chegar, chore não.

Me deixa porque eu não quero saber do que vão falar. Do que estão falando. Se eu sou boato, que se dane! Sou cria na boca de todo mundo, todo mundo sabe muito de tudo.

Me deixa porque me apaixonei por esse, já conheci aquele, apresentei ele para aquela. A vida é muito curta, vocês gostam da posição de plateia.

Me deixa porque 2014 é meu ano. Me deixa porque estou concretizando todos os meus sonhos e ainda vão ouvir falar muito de mim. Se vão!

Me deixa porque não tem graça alguma passar pela vida desfilando. Eu sou da pista, não do camarote. Eu vim para cravar esse chão, deixar meus rastros. Me deixa porque não sou de viver em vão, sou todo coração e minha obrigação é ser feliz.

Me deixa e traz mais uma cerveja aí, que tá faltando inspiração. Ainda tem muito samba pela frente, muito papel para rabiscar e ainda é sexta-feira. Me deixa que minha semana quem começa sou eu.

Ah, me deixa... 

terça-feira, 25 de março de 2014

Amor cortês

Queria poder falar de amor
Mas, de amor não sei falar mais não, moço.
Se foi amor o que vivi, há de ser coisa pouca.

Não sei o que é amar não, moço.
Se for amor as carícias, o toque...

De amor sei um pouco, sim.
Mas, não sei se foi amor não.



Amor, moço, é feito dar a luz à alguém
É permitir esse alguém nascer onde a gente se criou
Amor faz a gente se contrair todinho
Até ficar bem pequenininho, feito broto que vira flor.

Mas, amor dói moço.
Disso bem sei.
Sei se quero sentir isso não.

Ele é danado, entra na gente e não aceita sair.
Pode corroer também, do mesmo jeito que contrai.

O amor é cortês moço, já ouvi dizer.
Amor pode ser cortesia
Mas não se esquece de ser corte.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Depois de ter você

Depois de ter você, de que importa ser de mais alguém? Que lógica há de ter saber o que me faz bem? Para que servem madrugadas feito essas? E as conversas com a lua, da minha janela?

Depois de ter você, que sentido tem os carros que vem e vão? E toda essa solidão que me encontra quando não há mais luz? Que amor têm os homens? Qual prazer vou ter que conhecer de novo, depois?

Depois de ter você, como você pôde ser de outro? Como pôde deixar outros beijos acariciarem o seu rosto? Como foi assim, como conseguir ser tão mal para mim?

Depois de você, há de haver alguma coisa. Há de ainda ter o despercebido, o interessante e interessado. Há de sobrar algo dessas sobras de tanto amar em mim. Há de ainda fazer sentido algo assim.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

A gente tem mania de amar quem não tem tempo para isso.
E por não saber amar, a gente cisma com isso.
Talvez para se vingar.
A pessoa precisa nos amar.
A gente se esforça para ganhar bem.
Não consegue ganhar bem e gostar do que faz.
Quanto menos ter a quantidade de filhos que se gostaria de ter.
A gente acaba se contentando com o que a gente pode ser.
Morremos e a causa é o sufoco do pouco ou nada.
Ou do muito que ainda não agrada.
A gente não mora naquela casa
Nem naquele lugar
A gente mora aonde não tem as pessoas de lá.
A gente nunca quer estar onde está.
A gente se olha no espelho
E eu sei, você também se sente feio
Mas, não se sabe,  deve ser porque é seu aquele espelho
Como pode ser porque você tem um.
A gente anda a pé e gosta de ônibus
Quando se está no ônibus, se quer o trem
Quando estamos no trem, desejamos o carro
Quando temos o carro, queremos o avião
Ainda não contentes, temos que ter o jato
E o fusca? Fica para quem?
A gente tinha vitrola, inventaram o rádio
Dependemos da televisão
Não vivemos mais sem o tal do usb
Todos falam que é preciso ter
Então, temos que ter
E essa é a minha versão de ter ou ser. Eis a questão.